Sérgio Veloso tem 30 anos e acredita num estilo de vida saudável. O autor do blogue Fat New World descobriu o culturismo a tempo de solucionar uma adolescência de obesidade. Mas, mais do que perder peso (quase 50 kg), Sérgio percebeu que as bases nutricionais do culturismo possibilitam manter um peso saudável sem dietas yo-yo.
Hoje, com formação nas áreas do Metabolismo Celular e Nutrição Clínica, Sérgio Veloso dedica-se à formação avançada de nutricionistas, médicos, farmacêuticos, personal trainers, entre outros profissionais de saúde. É professor convidado na Universidade Lusófona, Instituto Superior de Ciências da Saúde Egas Moniz, e Universidade Europeia, colaborando também como formador em vários cursos de nutrição desportiva, composição corporal, bioquímica nutricional e metabolismo.
O Clube Fitness este à conversa com Sérgio Veloso.
Sabemos que tiveste uma adolescência marcada pelo excesso de peso. Que marcas isso deixou na tua vida?
Sim é verdade. Estrias e alguma pele a mais. Sei que não seria esta a resposta que queriam, mas evito expor a minha vida pessoal online. Não é por aí que pretendo criar empatia com o público e gosto de vincar bem a linha que separa o Sérgio como pessoa e como profissional e autor. Mas é óbvio que um passado de obesidade severa, com 120 kg aos 15 anos, deixa as suas marcas, umas já saradas outras talvez não tanto. Mas prefiro destacar o lado positivo, dando-me uma perspetiva única do que é a obesidade e o que passa um obeso, ainda muito estigmatizado por um estado que muitos julgam ser da sua exclusiva culpa e pelo qual é o único responsável. Não é tão simples quanto isso.
Quando surgiu o interesse pelo estilo de vida saudável? E porquê?Precisamente após a perda de peso. O difícil não é perde-lo, é sim manter esse peso perdido ao longo do tempo. Felizmente consegui fazê-lo e isso não teria sido possível sem modificações profundas de hábitos e estilo de vida.
No blogue afirmas que o culturismo salvou a tua vida. Como e onde descobriste esta modalidade? E o que te despertou para ela?
Não diria que salvou a minha vida. É demasiado dramático. Mas muitos dos princípios nutricionais e de treino ajudaram-me a manter esse peso perdido e a melhorar consideravelmente a minha composição corporal. Quando entrei para o primeiro ginásio, há 15 anos atrás, despertou-me a curiosidade sobre o culturismo pelos padrões estéticos que se alinhavam com o que gostaria de alcançar. Agradou-me a abordagem funcional e objetiva à nutrição, isto antes de iniciar a minha formação académica, mas que explica um pouco o meu caminho profissional.
Quantas vezes por semana treinas? E preferes treinar de manhã ou ao final do dia?
Depende. Diria que 4 a 5 vezes é o meu normal, mas neste momento estou a treinar um pouco menos. Houve também momentos em que treinei todos os dias, outros bidiários, mas paragens prolongadas nunca tive. O exercício tem sido uma constante nos últimos 15 anos, e acredito que um dos factores que me ajudou a manter o peso perdido. Quanto ao horário, habitualmente treino a meio da manhã e é a altura que sinto o meu melhor rendimento. Mas já treinei ao final do dia, e não foi por isso que deixei de ter resultados.
Tens uma formação muito vasta. És licenciado em Biologia Celular, Mestre em Biologia Humana e Pós-graduado em Nutrição Clínica. De que forma a tua formação contribui para o teu estilo de vida?
A minha formação no fundo valida o meu estilo de vida, congruente com os princípios em que acredito, mas acima de tudo com a evidência científica. Talvez por entender seja mais fácil de seguir, mas não acho que a formação seja um condicionante na adoção de um estilo de vida saudável e de equilíbrio.
O que é para ti ter uma alimentação saudável? Que cuidados básicos são fundamentais na alimentação?
Não existe uma alimentação saudável nem um modelo melhor do que outro, o que existem são algumas regras gerais que se subordinam à nossa fisiologia. No que toca à composição corporal, consistência é a chave do sucesso. Não comer junk food consistentemente, mas optar por alimentos com valor nutricional, otimizar a ingestão de hidratos de carbono à prática de exercício físico, e garantir um bom aporte proteico.
Quando e porquê decidiste criar o blogue Fat New World?
O Fat New World foi criado enquanto esperava pela defesa da minha tese e dei por mim com algum tempo entre mãos. Sempre gostei de escrever, mesmo vindo da área das ciências, e o blogue surgiu como um hobbie onde escrevia sobre os temas que gostava e aos quais dedicava muitas horas de estudo. O feedback foi positivo e tem crescido desde ai. Sentia uma necessidade de expor a evidência científica ao publico em geral de uma forma compreensível para todos, sobre uma área envolta de mitos e preconceitos sem fundamento mas tidos por muitos como certos.
Porquê a escolha deste nome?
O nome Fat New World é inspirado no livro de Aldous Huxley, Brave New World. O romance passa-se em Londres, no ano de 2540, uma altura em que as nações do Mundo estão unificadas num Estado único pacífico e próspero. Os cidadãos eram ensinados desde criança a valorizar o consumo, satisfazendo assim as necessidades sociais de emprego e de "distração" da mente. Mas este modelo de sociedade “perfeita” tinha o seu preço. Além da ocupação pelo trabalho e lazer no mundo material, a necessidade humana de transcendência e introspeção era satisfeita com uma droga alucinógena, o soma, um meio de auto-medicação controlado pelo Estado e que providenciava o conforto na face do stress, eliminando a necessidade de alienações pessoais ao interesse da comunidade. Uma sociedade entretida é uma sociedade submissa. Não havia livre arbítrio e eram impressas nas crianças uma série de memórias e crenças que, embora os julgassem seus, não eram mais do que frases repetidas vezes sem conta durante o seu sono.
“Brave New World” é uma obra polémica e que foi alvo de grande crítica no seu tempo, chegando a ser mesmo banida em alguns países. A sociedade que ilustra baseia-se nos princípios do Fordismo levados ao extremo: produção em massa, padronização, previsibilidade e consumo. Portanto, não muito diferente do mundo em que vivemos hoje, também a nível do conhecimento.
De que forma achas que podes ajudar as pessoas a mudar o seu estilo de vida?
Acima de tudo ajudando-as a pensar de forma crítica, dando as ferramentas para tomar as melhores decisões. O Fat New World não se posiciona como um blogue de soluções, nem se direciona para quem procura conhecimento express e fórmulas mágicas. Não existem, ou se existem eu não as tenho.
Que conselho darias a alguém que quer perder peso e transformar o estilo de vida?
Que comece ontem, de preferência acompanhado por um profissional que possa personalizar o programa e monitorizar a evolução. Que estabeleça prioridades, seja consistente e realista nos objetivos a atingir. Pequenas metas a vencer torna mais fácil a adesão do que grandes objetivos que só vemos à distância, mesmo sendo esse o verdadeiro alvo.