Entrevista
17Out
À conversa com Jorge Martins // Sem Aditivos
Em janeiro de 2013 foi-lhe diagnosticada Sarcoidose Pulmonar. "Nunca tinha ouvido falar, excepto no Dr.House." Foi mais teimoso que a doença e fez frente ao "bicho" e ao tratamento. Pelo caminho mudou o seu estilo de vida. O Clube Fitness esteve à conversa com o autor do blog Sem Aditivos.
Jorge Martins, 34 anos, mudou a sua alimentação e aderiu à dieta Paleo. Ao mesmo tempo, começou a treinar com regularidade. Decidiu que iria ficar em forma e, para facilitar, rejeitou a ideia de frequentar um ginásio. Treina em casa e os resultados estão à vista!
Quando amigos e familiares lhe começaram a pedir conselhos, surgiu a ideia de criar e escrever um blog. Daí nasceu o Sem Aditivos.
À conversa com Sem Aditivos
No blog afirmas que “nunca esperei enveredar por estas andanças”. A transformação no teu estilo de vida é relativamente recente. Como era a tua vida antes da transformação?
Na realidade não é muito diferente do que é agora, o que é bom sinal porque
significa que melhorar a minha alimentação e actividade física não veio de modo algum complicar a minha rotina normal! Sempre fui apologista de obter o máximo de resultados com o mínimo de esforço e foi esse o princípio que tomei nesta mudança.
Em Janeiro de 2013 foster diagnosticado com uma doença autoimune, Sarcoidose Pulmonar. Explica-nos primeiro o que é esta doença.
Bem, copiando palavra por palavra a explicação que coloquei no blog, a
Sarcoidose é uma doença auto-imune bastante rara que pode atacar diversos órgãos do corpo sendo o mais comum os pulmões. Promove o aparecimento de granulomas que poderão crescer e migrar para outros órgãos provocando inúmeros problemas a longo prazo.
De um modo simplista (a classe médica pode gozar à vontade com a terminologia), são massas que num orgão poroso como o pulmão (que foi o meu caso) podem passar relativamente despercebidas, mas noutro mais denso, como o fígado, pode ser muito complicado.
O tratamento da doença foi à base de cortisona. Quais são os efeitos secundários e quais tu sentiste?
Essa foi a parte que mais me assustou. Os médicos disseram-me que a taxa de sucesso no controlo da sarcoidose era elevadíssima e isso deixou-me relativamente descansado, mas o tratamento teria de ser obrigatoriamente cortisona.
No meu caso concreto, de acordo com a dosagem prescrita,
a médica preparou-me para um considerável aumento de peso, queda de cabelo, depressão, dores de cabeça, diabetes, osteoporose, etc.
Destes todos sofri exactamente... zero! Lembro-me bem de me perguntarem nas consultas de seguimento se eu tinha deixado de tomar a medicação, já que para além de não estar a engordar estava a ficar cada vez com melhor aspeto.
Desde o início decidiste fazer frente à doença e ao tratamento e, claramente, não desististe de ficar em forma. Onde conseguiste tanta motivação? Nunca tiveste vontade de desistir?
Curiosamente não,
nunca me passou sequer pela cabeça desistir, até porque a motivação veio precisamente da doença! Tenho a convicção de que quando as coisas nos correm mal não serve de nada baixar os braços, aliás, acho que sou bastante mais preguiçoso quando a vida me corre bem (risos).
Tento sempre manter uma atitude positiva, até porque a preocupação por antecipação é das maiores parvoíces que pode haver! Se correr mal tenho tempo de sobra para me preocupar depois. Neste caso
a motivação era pura e simplesmente vencer a doença, era esse o “prémio final”!
Tu começaste a treinar em casa, excluíste o ginásio. Porquê?
Já tinha começado antes do diagnóstico e inicialmente tinha sido pelo fator económico! Hoje em dia já temos ginásios “low cost”, mas na altura, em Torres Vedras, para ir a um ginásio com o mínimo de condições fazer um treino simples não havia opções abaixo de 40€ por mês!
Com o tempo apercebi-me de que
é bem mais difícil para mim chegar a casa do gabinete, arranjar um saco e voltar a sair (especialmente em noites de chuva e frio), do que chegar, vestir uns calções e “despachar” um treininho num abrir e fechar de olhos!
Mas não tenho nada contra os ginásios, reconheço aliás a praticidade de ter um espaço com um sem número de ferramentas à disposição e percebo perfeitamente quem os frequenta.
Como é possível treinar em casa e obter resultados?
Tenho ideia que no campo do exercício fisico esse é dos maiores mitos que há!
Para ter resultados só precisamos de uma coisa, treinar. Para treinar só precisamos de uma ferramenta, o nosso corpo.
Voltando um pouco ao tópico anterior, acho que ficamos deslumbrados com as máquinas intricadas que vemos no ginásio e esquecemo-nos que a maior parte delas estão ali como variações dos três movimentos mais simples e eficazes que existem, a flexão de braços, o agachamento e a elevação.
Não precisamos de muito mais do que estes três simples movimentos para obter resultados.
É claro que para resultados específicos como o culturismo, ou a competição desportiva, são necessárias ferramentas especificas, mas para o ser humano comum (que é o meu caso) não me parece minimamente obrigatório. Porque é que havemos de começar a treinar numa geringonça cheia de cabos e pesos se nem sequer conseguimos fazer uma elevação como deve ser?
Explica aos nossos leitores as regras principais para treinar em casa e não desistir da atividade física.
Em primeiro lugar
é preciso querer, essa é a base de tudo. Depois
precisamos de um pequeno espaço que não exija arrumação constante. Se todos os dias tiverem de montar e desmontar o vosso “ginásio” a coisa não vai durar muito. Dois metros quadrados chegam bem.
Simplifiquem.
Não queiram começar à campeão. Comecem por treinar umas três vezes por semana (a minha média foi sempre três a quatro com o objetivo nunca totalmente cumprido de passar a cinco) e mantenham os treinos curtos, no máximo 30 ou 40 minutos de início (se fizerem HIIT até podem ser só 12 ou 15 minutos).
Definam um horário de treino aproximado (seja de manhã, à hora de almoço ou ao fim do dia) e tentem cumpri-lo. Alterem só se não tiverem outra hipótese, não há nada que uma rotina bem estruturada para ver resultados.
Ouçam música. Ponham algo com ritmo, que vos motive e não se importem de ouvir sempre as mesmas músicas de dia para dia. O padrão de repetição vai levar a que mesmo nos dias de menor disposição automaticamente entrem no ritmo.
Para além do exercício físico, aderiste à Paleo-Diet. Porquê?
Na altura procurei a ajuda de um amigo meu nutricionista, o Alexandre Azevedo, para lidar com os efeitos secundários da cortisona e ele aconselhou-me uma
dieta baixa em hidratos de carbono baseada na Dieta Paleo, já que estudos recentes revelavam uma taxa de sucesso considerável no tratamento de doenças auto-imunes.
Comecei a pesquisar a dieta, o que me levou à Primal, à Low-Carb, a autores como o Mark Sisson, ou o Tim Feriss e imediatamente identifiquei-me com os princípios partilhados por eles. Com o tempo fui assimilando conceitos diferentes
até chegar à minha Paleo pessoal, adaptada ao meu estilo de vida!
No que consiste – resumidamente – a Paleo-Diet?
Ui, essa pergunta tem pano para mangas, mas vá, digamos que
a dieta Paleo é uma dieta baixa em hidratos de carbono, que defende uma alimentação o mais natural possível e eliminando os alimentos processados. Este princípio vai de encontro à crença de que os últimos 10'000 anos que passámos a comer cereais não chegaram para nos adaptarmos a eles como fonte principal de energia face aos 200'000 anos que fomos caçadores recolectores, ao longo dos quais nos alimentávamos predominantemente de gordura, proteína, vegetais, fruta e bagas que íamos encontrando na natureza.
Não, não é obrigatório o uso de tanga de pêlo (mas é opcional, não proíbo ninguém) e não, não andamos a comer carne crua à mão. Imaginem comer o que comem na dieta tradicional portuguesa, mas o acompanhamento são vegetais ou salada! Simples.
Tens alimentos que não comes ou evitas comer? Quais?
No topo da lista está
o açúcar. Mas não é só o açúcar do pacote! Sempre que digo isto ouço logo “Ah eu não ponho açúcar em nada”, pois, mas o problema é que no geral o açúcar é adicionado a tudo, por isso passa a ser importante ler rótulos.
A seguir vêm
todos os produtos de pacote com ingredientes inteligíveis e não existentes na natureza, nada disso foi feito para metermos no nosso corpo, muito menos aqueles que foram altamente alterados e rotulados como “light”, “magro”, ou “0% gordura”.
O á
lcool não corto, mas ingiro com muuuuita moderação e geralmente só ao fim de semana.
Por fim
o pãozinho e farinhas de cereais no geral, porque depois de entrarem no nosso corpo, são iguaizinhos a ingerir açúcar. Mais vale estar quieto.
Durante a semana fazes uma cheat meal?
Uma ou duas, sem dúvida!
Altamente essencial para mantermos a sanidade mental. O importante é sabermos que nos faz mal, de resto há que viver a vida também!
O que mais gostas de cozinhar? Porquê?
Ovos. Porque são rápidos e fáceis de cozinhar e são altamente nutritivos, dos alimentos mais completos que existem. Foram erradamente difamados durante anos, mas finalmente começam a ter outra vez algum reconhecimento. Para além do mais sabem bem fritos, cozidos, escalfados, no forno! São incríveis.
Vou deixar uma menção honrosa para o
frango assado. Se me dissessem “a partir de hoje só podes comer uma coisa” a resposta seria frango assado, mas como esse normalmente já compro cozinhado vou-me ficar pelos ovos (risos).
Foi quando alguns amigos e familiares te começaram a fazer perguntas e pedir conselhos que alguém te disse “devias escrever um blogue”. Da ideia à ação quanto tempo passou e porquê o nome “Sem Aditivos”?
Boa pergunta!
Foi um processo um bocado orgânico, mas diria que uns bons seis meses no mínimo. Organizar as ideias, perceber o que queria fazer, aprender a trabalhar com a plataforma do blog. Foi motivante, mas demorado e trabalhoso.
O nome foi a Filipa que sugeriu. Eu andava a circular qualquer coisa que tivesse a ver com a Paleo e ela achava que devia ser algo mais abrangente.
Quando me sugeriu Sem Aditivos senti o clique, fazia sentido!
Tu afirmas que o teu objetivo com o blog é partilhar a tua experiência e ajudar quem queira mudar o seu estilo de vida. Qual é o primeiro passo para alguém começar a ter um estilo de vida saudável?
O mesmo passo para começar a treinar...
querer!
A maior parte das pessoas que diz que amanhã tem de começar a ter juízo na realidade não quer! É preciso racionalizar e pensar muito a sério no custo/ beneficio da mais pequena das decisões. São preferíveis 5 minutos de prazer com um pastel de nata todos os dias, ou todos os dias olhar ao espelho e vermos alguém de que nos orgulhamos?
É preciso querer e não tirar os olhos do prémio.
Sabemos que foste pai recentemente. Como vais inspirar o teu filho a ter uma vida saudável?
Dando o exemplo, os miúdos apanham tudo por imitação. Vou continuar a viver a minha vida deste modo, vou inseri-lo o mais possível nela e esperar que ele absorva esses ensinamentos por si mesmo.
Fora isso vou tentar não “forçar a barra”, não quero que ele se sinta obrigado a nada senão vai sempre encarar como uma obrigação, eu não sou “religioso” e não há-de ser agora que vou passar a ser!
De resto também terá direitos aos disparates dele, eu também os tive e estou cá para contar a história.